Palavralgia
Eu não tenho nome.
Nasci assim, sem identidade,
Sem ente, sem dente, sem idade.
Me animo sozinho,
Ninguém me chama
E ninguém extingue a chama,
Porque ela já nasce extinta de chamado.
Não é preciso.
A imprecisão é a distinção
Do que nasce extinto,
Sem tintas, sem letras, sem nome.
No anonimato, toda a invisibilidade,
Toda a transparência,
Toda a indigência,
De toda gente sem...
Palavralgia
Hoje o caderno gueri-gueri deu a luz,
Após mais de um ano de trabalho de parto.
Mas as terras desérticas
De suas páginas em branco
Precisam de lavragem
A fim de que se possa colher frutos nestas paragens.

Mesmo no deserto pode haver flores,
Mas é preciso abrir sulcos em linhas, cavar fundo
Para tornar o terreno fecundo.

Singra sulco sangra
E molha a terra tórrida
Para arrancar do ventre dorido
Os frutos, filhos da dor
Que fazem brotar no árido espaço
O que é o desejo do autor.
Palavralgia
Em certo momento da caminhada,
Interminável clareira me atravessa
Em meio à plena verdura florestal.
Tudo é silêncio.
Nenhum movimento.
Só o não,
A cada pedaço de chão.
Chão sem caldo, sem recheio,
Cheio de pó e de pé.

É assim
Que o deserto anda em mim.