Palavralgia
Perdi o controle.

Não sei onde foi parar. Estou tentando encontrar em todos os lugares, vãos e entrevãos. Tudo em vão! Chego a duvidar sobre se realmente eu o tive nas mãos. Talvez remotamente. O problema é que eu acreditei ter o controle. Agora compreendo que possivelmente ele nunca  tenha estado aqui, deduzo após certo tempo de procura. Eu estava tão acostumada a seus mecanismos de acionamento, que é impossível suspeitar da sua existência. Há de estar por aqui em algum lugar. Continuo a busca porque não posso perder o controle, sobretudo em razão de, talvez, nunca tê-lo possuído de verdade. Então, o que eu tinha nas mãos? Creio que acreditei ter algo de concreto. Controle é algo fácil mesmo de se perder, é algo que escapa das mãos diante dos olhos. "Mas estava aqui agora mesmo", murmuro de mãos vazias. O que fazer sem o controle? Tentar não me descontrolar e entender que nem sempre é possível ter o controle nas mãos. Quando não der para ter o controle, ainda que remotamente, o melhor é mudar de canal imediatamente.

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Palavralgia
Cada um tem o seu lado. O meu fica bem chegado, embora pareça distante. Quando o Sol aparece, eu mudo de banda. Pareço-me mais com um polígono, pois circulo por todos os espaços. É no pôr do Sol que viro ao contrário, para tomar distância, mesmo estando bem aqui ao lado. Esperteza é estar perto, apertado, nunca apartado, independente de qual seja o lado.
Palavralgia
Imagem: Cândido Portinari, Seca, Gravura antiga, 17 X 26 cm
O Mundo dos Mortos é um conto constante da publicação Além do Muro da Estrada, de 2016. Este texto trata da chegada de um singelo sertanejo a um grande centro urbano. Em fuga da escaldante seca nordestina, o moço vai tentar uma vida com menos sofrimento. Acontece que, ao chegar à cidade grande, Vivaldo, o ingênuo sertanejo protagonista da história, é acometido por um grande estranhamento. Ele passa a achar tudo muito diferente, muito estranho, a começar pelo comportamento e atitude das pessoas. Esse estranhamento provoca uma espécie de delírio que vai se exacerbando na medida em que o rapaz vai se deparando com as situações típicas de uma grande cidade.

Abaixo, para degustação, um trecho do conto.

Neste ponto da história, cansado de ser desprezado, discriminado e precisando muito de ajuda, o personagem passa pela seguinte situação:

"... ao acabar de deixar a igreja, um moço muito bem apessoado, usando terno e cercado de seguranças, veio sorridente em sua direção. Vivaldo mal pôde acreditar. O homem chegou bem perto, estendeu-lhe a mão e a apertou vigorosamente, puxando-o de encontro ao peito para um caloroso e demorado abraço. Naquele momento, o sertanejo pensou ter ressuscitado. Seu puro coração bateu forte de tanta alegria. “Será que ele me reconheceu de algum lugar?”, pensou o ingênuo rapaz. Suas esperanças renasceram durante aquele abraço tão apertado, tão íntimo, de quase irmão que não se vê há muito tempo. “Nem tudo está perdido”, imaginou. Essa era a ajuda de que necessitava para contar aos robôs-zumbis que eles estavam todos mortos. O moço de terno era diferente, era simpático, sorridente, solícito, talvez o ajudasse a convencer os que caminham com o olhar vago. Naquele demorado abraço, Vivaldo já se sentia quase um parente. Nunca ninguém o tratara assim, com tanta deferência, nem mesmo sua mãe, a qual nem conhecera porque a pobre reviveu para o mundo das almas na hora do parto. Ela renascendo e Vivaldo morrendo, porque morte é assim: é necessário um período de nove meses para ir se acostumando com ela, com muito vagar, de pouquinho em pouquinho vai se formando o escafandro imprescindível à morte, a fim de que o finado possa transitar pelo pesado mundo dos mortos. A morte de Vivaldo foi, assim, agravada pelo abandono já na chegada.

Abandono este que marca sua trajetória desde o início, não só a sua, como a de muitos, dependendo da sina de cada um.

O sorridente moço, então, desenlaçou Vivaldo para dar-lhe um beijo na testa e voltar a apertar-lhe a mão. “Será que estou no paraíso?”, questionou a si mesmo o humilde rapaz, mudando radicalmente suas impressões anteriores, agora se sentindo muito importante, tanto que começava até a estufar o peito e olhar os passantes com certo orgulho. Aquilo para ele era como chuva no sertão. A salvação da lavoura! Depois de soltar-lhe a mão, antes que Vivaldo pudesse balbuciar qualquer palavra, o agradável moço, retirou do bolso um grande cartão e lhe entregou, despedindo-se, mais uma vez, com um forte abraço e outro aperto de mão. O inocente rapaz ficou segurando o cartão e contemplando o portentoso moço se afastar acenando e cumprimentando a todos que lhe cruzavam o caminho.

“Viu? Nem tudo está perdido! Que moço gentil! E agora é meu amigo!”, ficou imaginando Vivaldo que ainda tinha o sorriso nos lábios e sentia o abraço apertado do amigo que, enfim, conseguira fazer na cidade grande. Ficou assim, meio embasbacado, com o cartão na mão, olhando para o amigo que, rapidamente desaparecia em meio a incessante cadência dos robôs-zumbis. Quando o novo amigo sumiu totalmente, ele ainda esticava o pescoço para acenar e sorrir, mas já não dava para alcançá-lo com os olhos. Por algum tempo ainda Vivaldo permaneceu parado, olhando para o nada, com o sorriso nos lábios, até se dar conta de que precisava retomar seu caminho. Percebeu, então, que conservava nas mãos o cartão que o gentil moço lhe entregara. Pensou que certamente seria um contato para um encontro com mais privacidade. Olhou depressa para o cartão, deparando-se com a foto do sorridente camarada e um número. Seria seu telefone? Logo abaixo, Vivaldo conseguiu ler em maiúsculas: 'VOTE NO MURTINHO PARA PREFEITO!'."


Palavralgia
https://ims.com.br/titular-colecao/mario-quintana/
Ontem, navegando por sites literários, acabei entrando em uma página sobre o Mario Quintana, este poeta importante da nossa literatura. Pude relembrar, então, um poeminha que havia estudado na época da faculdade e que retrata bem a alma deste incrível escritor. Reproduzo-o abaixo:

Poeminho do contra

Todos esses que aí estão
Atravancando o meu caminho,
Eles passarão…
Eu passarinho!


Trago este texto para o blog porque, desde os tempos da faculdade, sempre que o leio, sinto que algo se move na minha alma, provocando arrepios na pele e aceleração do coração. Alguns textos me causam estas sensações sensacionais.

Como a gente se incomoda com bobagens, não é mesmo? Bom é ter a alma leve, livre e solta, como um passarinho.

O que observa-se, neste poema, é uma brincadeira com palavras parônimas de classes gramaticais distintas. O esperado era que o poeta usasse dois verbos após os pronomes pessoais "eles e eu".  A palavra "passarão", que não significa pássaro grande, mas o verbo passar no futuro, ajuda a transmitir a ideia pesada do “ão” (porque também serve para o aumentativo). Isto, em contraposição à leveza comunicada através do substantivo "passarinho", no diminutivo, cria  o sentido poético que consegue traduzir um sentimento de suavidade e despreocupação. 

Então, pelo menos dois recursos poéticos podem ser observados:

1- A utilização de palavras gráfica e foneticamente similares (parônimas) com classes gramaticais e sentidos diferentes, provocando um efeito sonoro muito interessante, o que revela a presença da aliteração, figura de linguagem que se caracteriza pela repetição de fonemas idênticos ou parecidos.

2- A contraposição entre “ão” e “inho” transmite uma ideia de antagonismo. O substantivo passarinho já transmite uma ideia de fragilidade pela figura que representa: animalzinho pequeno e delicado. Esta palavra, em oposição ao verbo no futuro com o uso do “ão”, cria a beleza dos versos.

Isso é genialidade, comunicar sentimentos construindo estruturas vocabulares com extrema sabedoria e beleza. Isso é o que se chama de arte.


Palavralgia
http://gritaminhaalma.blogspot.com/2011/11/
Morte é uma palavra bela,
Mas há muito preconceito com ela.

Morte não é só choro, luto e tristeza,
A palavra também traz, em sua essência, beleza.

Morte é mudança, é renovação, é corte.
Morte é para quem é forte, quem diria?

É pra quem consegue
renascer a cada dia!

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https://www.shutterstock.com/pt/search/defeated
Revisitando Fernando Pessoa, encontrei este famoso texto escrito, por seu heterônimo Álvaro de Campos, entre os anos de 1914 e 1935. O que me chamou atenção neste quase centenário poema foi a sua atualidade.

"Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus imãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza."
Palavralgia
Foto: Anselm Baumgart / Shutterstock.com
Amar é... a maré
Que enche, transborda e vaza.
É preciso cuidar para não confundir
O que é profundo e
Cair em água rasa.

Maré cheia, lua cheia,
Plenitude, que beleza!
Mas assim como a minguante,
A vazante também chega!

Ficar na superfície,
Não é garantia de certeza,
Mas para mergulhar fundo,
É necessário destreza.
Palavralgia
https://pixabay.com/pt/photos/matem%C3%A1tica-quadro-negro-educa%C3%A7%C3%A3o-1547018/
Não quero ser fera, quero ser esfera e integrar o círculo. 
Quero percorrer a reta e chegar a um ponto.
Quero unir os pontos na fração de um segundo.
Quero existir e pertencer ao conjunto.
Quero inventar operações.
Não quero ser quadrilátero, quero ser “de visão”.
Quero multiplicar a ação.
Quero ser “eco-ação”.
Quero ter expressão.
Quero ser a parte, quero estar no todo.
Quero ser logo, a ritmo acelerado.
Quero ter ângulo, quero ser vértice.
Quero percorrer todas as curvas e descobrir novas áreas.
Não quero ser menos, não quero ser mais, quero ser igual.
Não quero ser mais um, não quero ser menos um...
Quero ser, simplesmente, um.

Texto escrito em 1998.
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https://www.fiverr.com/ibrahimvusama/create-a-personal-word-art-family-tree-or-other-shape
A secura e a aridez não se prestam às florestas lexicais. Estas precisam de umidade e humanidade para serem preservadas do ressecamento e do desflorestamento. Todas as espécies de palavras devem ser protegidas contra a escassez de pensamentos, mantendo-se, assim, a diversidade florestal. Os constantes cortes, ataques e subtrações acarretam erosão e empobrecimento do solo, que deixa de receber as torrenciais chuvas de ideias fertilizantes. Os rios do entendimento e da compreensão param de fluir naturalmente em seu curso, assoreados por cristalizações do conhecimento que também fica impedido de escorrer livremente.

Ergue-se, então, mais uma antiga bandeira nesta cada vez mais vasta clareira: salve a floresta lexical. Abaixo a degradação e a decadência que promovem a extinção do bioma textual!
Palavralgia

Escrever é como encontrar um porto seguro,
apertar bem as amarras
e deixar-se partir,
para somente aportar
quando novo rumo despontar.

Partir é bom.
Repartir, um tanto melhor!
Mas, para escrever,
é preciso desbravar,
a fim de descobrir
novos pontos de partida.
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https://photos.app.goo.gl/aNHrGnwjXvjMtdcn7
O que vai ser hoje?

A minha netinha de dois aninhos, brincando numa dessas casinhas de parquinho, abriu a janelinha e, inesperadamente, com olhinhos vivazes, já usando a sua criatividade com o seu linguajar de bebê, me perguntou: "vovozinha, o que vai ser hoje: morango ou uva?". Eu logo entendi e entrei na brincadeira transfor- mando-me, imediatamente, em cliente da sua imaginária sorveteria. Escolhi uva, encantada por testemunhar uma sementinha que, se bem adubada e cuidada, vai crescer saudável e dar bons frutos. Estas sementinhas precisam ser bem cultivadas, pois são o futuro do país. Que cabecinha! (confira o vídeo clicando no link acima)

Não se pode dizer, no entanto, que seja "uma uva", como se falava antigamente, a Educação neste país. Cada vez mais, menos pessoas têm incentivo à criatividade, acesso à leitura e à Educação no Brasil, que marca triste e vergonhosa presença nos últimos lugares do ranking mundial de índices de alfabetização, enquanto livrarias e editoras encerram suas atividades.

Isto se dá porque o atual modelo educacional caducou, ficou obsoleto, não funciona mais. Esta a causa de tantos conflitos que vemos todos os dias. É preciso inovar, focar em competências em vez de entupir os alunos com conteúdos que não irão desenvolver suas habilidades e capacidades.

Eu, que sempre gostei de morango e uva, assim como de ler e escrever, escolhi a Educação como profissão e continuo tentando buscar caminhos para incentivar a leitura e a escrita.

Recentemente, estive em Buenos Aires e fiquei surpresa de ver uma livraria em cada esquina, todas lotadas mesmo de madrugada, apesar da crise que também assola aquele país. Uma atmosfera muito cativante é criada com tantos cafés-livrarias por todos os lados. Ambientes em que pessoas estudam, trabalham, leem, ouvem música, se encontram, conversam, produzem. Impressionante.

Infelizmente, ao voltar ao Brasil, não pude deixar de observar a contradição: em cada esquina, por todos os lados, ergue-se uma farmácia num abrir e fechar de olhos. 

Certamente, será doce qualquer que seja a escolha entre as opções uva e morango da sorveteria imaginária da minha netinha. Mas, infelizmente, não se pode dizer o mesmo em relação às opções livraria e farmácia.

A farmácia não é a solução para os conflitos de jovens e adolescentes, embora a indústria de psicofarmacos para este público tenha crescido absurdamente na atualidade. A escola também não é solução, porque não dá para delegar tudo à instituição de ensino. Mas esta deve ser um espaço onde se possa discutir e descobrir caminhos para as questões da contemporaneidade, porque tudo perpassa o espaço escolar.

Não dá para desanimar. Há um trabalho a ser feito e depende de cada um. Tudo está em constante transformação. Precisamos nos atualizar e mobilizar a fim de que possamos contar, não apenas com farmácias, mas também com livrarias, cafeterias, espaços escolares mais atrativos e etc. Ah! e sorveterias que sirvam sorvetes  deliciosos de morango, uva e muito mais. Afinal, a vida precisa ser, também, saboreada e desfrutada. 



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https://becoliterario.com/resenha-livro-me-aurea-stela/?fbclid=IwAR1vjDg2xCiVryZqQ0H5JFkggGXMipRbUvyCLOoCGzM2L2psAcoAE1AbyHw
Volta e meia, deparo-me inesperadamente com resenhas inéditas dos meus livros! Adorei esta feita pelo Gustavo Machado, do Blog @beco.literario. Ficou show, Gustavo, só agora tive acesso e por acaso. Amei seu olhar filosófico!

Para ler a resenha do Gustavo, basta clicar no link abaixo da imagem.
Palavralgia
Imagem: http://www.joaocarvalho.com.br/site/artigos
Há um vazio repleto!
Algo que não há como
Definir ao certo.
Talvez uma plenitude de nada
Que se percebe nos entrevãos de tudo.

Palavralgia
https://pixabay.com/pt/photos/balao
Certa feita, quando eu ainda estava na faculdade, li um texto (pesquisei para tentar encontrá-lo e citar a fonte, mas não o encontrei) onde o próprio Guimarães Rosa falava sobre o processo de criação de um dos seus mais famosos contos: A Hora e Vez de Augusto Matraga integrante do seu não menos famoso livro Sagarana. Contava Rosa que estava dentro de um ônibus quando lhe veio a ideia do conto. Ele relata que evitava olhar para os lados para impedir que a ideia escapasse. A inspiração, segundo o escritor, assemelhava-se a um balão que pairava sobre sua cabeça. Seu receio era de que o balão se rompesse com qualquer distração e a inspiração fosse perdida para sempre. Ele, de olhos fechados, apertava levemente, com os dedos polegar e indicador de uma das mãos, o lugar entre as sobrancelhas a fim de se fixar ao "balão”. Quando o ônibus freava, sentia como se o balão fosse se desprender e estourar. A impressão era a de que o balão se movimentava, para frente e para trás, conforme o balanço do coletivo. Não via hora de saltar para, enfim, registrar suas ideias. Quando chegou ao seu destino, não falou com ninguém, foi direto em busca de papel, lápis e um lugar sossegado. Assim foi criado o conto A Hora e Vez de Augusto Matraga que, mais tarde, viraria filme. E nós damos graças a Deus porque o balão não se estourou.

A imagem do balão é muito ilustrativa quando se fala de inspiração e vai bem ao encontro do que relatou a escritora Clarice Lispector sobre a sensação de vazio após terminar um trabalho, quando todo o conteúdo do “balão” já foi despejado. Então, o "buraco" se instaura. Diz a escritora, no livro Clarice Lispector entrevistas (deixo as referências bibliográficas no final do artigo), que, quando não está escrevendo, não sabe como é que se escreve.

O cantor Chico Buarque relatou a Clarice, no mesmo livro: “hoje acordei com um sentimento de vazio danado porque ontem terminei um trabalho.” Ao que a escritora respondeu: “Eu também me sinto perdida depois que acabo um trabalho mais sério.”

É muito interessante refletir sobre o relato destes grandes vultos nacionais a respeito do vazio após a escrita. Este sentimento de que nunca mais será possível escrever de novo é extremamente angustiante e até comparado à morte por alguns autores, inclusive pela própria Clarice.

Ocorre o esgotamento do tema quando se termina uma obra. Isso produz um efeito de escassez porque somente haverá plenitude novamente quando outro tema se apresentar. Mas quando? Sobre isso, nenhum autor pode ter certeza e a dúvida paira no ar. Será que a inspiração vai chegar? Esta é a eterna inquietação dos que trabalham sob inspiração.

“Vem às vezes em nebulosa sem que eu possa concretizá-lo (o trabalho) de algum modo. Também como você (Chico Buarque), passo dias ou até anos, meu Deus, esperando. E, quando chega, já vem em forma de inspiração. Eu só trabalho em forma de inspiração.”

LISPECTOR, Clarice. Clarice Lispector entrevistas. Rio de Janeiro: Rocco, 2007.
Palavralgia
Eu sou contida!

Só algumas vezes.
Outras, eu me desperdiço
Em toadas entoadas
Sem qualquer contenção.

Sigo derramando-me
Por todos os lados
Em versos entoados
Para espalhar o coração.

Palavralgia

Ler Clarice é como se aprende a ler.

Escrevi a frase acima porque tenho revisitado Clarice ultimamente e ela é sempre surpreendente e inovadora. Por mais que você a releia, sempre encontrará algo transcendental em qualquer coisa banal.

O que me captura em Clarice é o seu olhar diferente para coisas banais do dia a dia. Um olhar que as pessoas comuns não têm. Para mim, um ovo sempre será um ovo, mas o olhar de Clarice nele alcançará algo diferente. Esta capacidade é ao mesmo tempo surpreendente e arrebatadora: surpreendente porque seu olhar sobre as coisas triviais são impensáveis e arrebatadora justamente porque surpreendente e inimaginável.

Esta forma diferenciada de ver as coisas é como um estranhamento. Observar o universo com um olhar incomum, estranho era o natural de Clarice, pois ela mesma era estranha, estrangeira. Talvez o sentimento de não pertencimento fizesse com que Clarice estranhasse o mundo ao seu redor e esta peculiaridade fez toda diferença em sua obra.

A escritora nasceu em uma pequena cidade da Ucrânia. Seus pais fugiam da Guerra Civil Russa e só pararam na cidadezinha ucraniana para Clarice nascer. De lá, migraram para Brasil, tendo vivido em Maceió, Recife e Rio de Janeiro. Mais tarde, quis o destino que Clarice não fixasse paradeiro e continuasse a ser estrangeira. Ela correu mundo ao casar-se com um diplomata, tendo morado em países como Itália, Inglaterra, Suíça, Estados Unidos o que, possivelmente, reforce o sentimento de estranhamento que perpassa todo o seu trabalho.

Por ter mencionado neste breve artigo, recomendo o conto O Ovo e a Galinha e, por ter sido arrebatada à primeira leitura, e também à segunda, e, possivelmente nas próximas, indico o conto A Imitação da Rosa, que é também o motivo desta postagem. Os dois contos são da autora, é claro.

Depois me contem suas impressões.
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Imagem: https://www.ohmygift.co.uk/
Levei um tiro!

Pegou bem em cheio no meu coração. Pareceu um tiro de canhão, porém não senti nada. Achei que tinha morrido, mas sobrevivi ao turbilhão. Quantos não resistem aos tiroteios e balas perdidas?

Não sei de onde veio este disparo que fez disparar meu coração e quase o parou para sempre. Não ouvi o estampido, mas fui levado às pressas. Tive sorte e muito medo da morte, que sorriu um sorriso embaçado para mim, depois sumiu em meio a uma névoa espessa.

O impacto do tiro, milagrosamente sem efeito mortal como era de se supor e acreditar, deixou cicatrizes difíceis de apagar. São marcas forjadas muito mais nos tecidos sutis das camadas psíquicas, que propriamente na pele.

O tiro foi como uma bomba que explodiu danificando a outra bomba que quase parou de bombear por causa do bombardeio. Quantos não perecem? Os bombardeios são constantes nesta esfera. Os tiros partem de todos os lados. Isso estraçalha corações, despedaça construções, destrói conexões.

O meu coração biológico, que nunca foi terra de estiagens, agradece a oportunidade de continuar no compasso, ultrapassando, por pontes seguras, com relativa serenidade, todas as adversidades.

As pontes do meu coração cidadão ligam esperanças a sonhos. Por isso, ele continua milagrosamente batendo e combatendo, em meio a uma guerra injusta e dolorosa, no intuito de fazer o direito à vida prevalecer.

O meu coração continental precisa agora de pontes resistentes para realizar a travessia segura, de uma, para outra realidade a qual, se espera ardentemente, seja de reabilitação, a fim de que a vida flua com mais respeito e sentimento de dignidade no peito.
Palavralgia
Imagem: Rádio Nova Era, de Brasília
Estou me acabando de rir! A vida é engraçada: numa hora a gente ri para se acabar, na outra, a gente não acha graça de nada. 

Estou me acabando de chorar! A vida é triste: numa hora a gente chora para se acabar, na outra, a gente não vê por que chorar.

Estou me acabando de rir e de chorar, porque estou me acabando. Assim é feita a vida: numa hora a gente ri porque acha graça, na outra, a gente chora de tristeza. De tanto rir e chorar, uma hora a hora chega e a gente se acaba porque é da nossa natureza.
Palavralgia
A escrita, para mim, funcionará sempre como terapia.
Palavralgia
Segui os passos da minha avó, que trabalhava numa fábrica de tecidos. Ela tecia fibras naturais para confecção de peças de vestuário, mas a empresa acabou sucumbindo às importações e minha avó precisou se aposentar.

Enveredei pelos mesmos caminhos, mas o meu tecido é feito de tessitura tênue, mas firme, com fios narrativos e serve para desnudar pensamentos. Entre mim e minha avó existe um hiato de tempo: não aquele que fez com que ela partisse antes de mim, mas o que possibilitou a nossa produtiva convivência, apesar da diferença de idade. O contato próximo com os avós é sempre uma experiência enriquecedora.

O generoso e terno mundo permitiu que eu tivesse proximidade com duas avós, ambas tecelãs. Da minha avó paterna, herdei trançar com linhas e agulhas. O tempo teceu para mim avós que me couberam como uma luva de crochê. Elas me ensinaram a ver o mundo através de linhas entrelaçadas em intrincadas tramas. Por isso, escolhi ser tecelã de palavras. Com estes tecidos, dispo minha alma, confeccionando lindas fantasias que me cabem perfeitamente para transitar neste mundo tão generoso e terno.

Assim, à medida que avanço nos tecidos, cubro-me, ou melhor, descubro-me operária desta fábrica que, assim como a da minha avó, está fadada a fechar. Contudo, este mundo terno e generoso nunca permitirá que eu me aposente como tecelã. Continuarei sempre em meus aposentos entrelaçando fios narrativos para despir sentimentos.
Palavralgia
Tbt - Noticiado por ocasião do lançamento do Palavralgia.
Palavralgia


Sou fazendeira.

Em minhas propriedades,
Cultivo letras, fonemas, morfemas
para produzir poemas.

Por ocasião da colheita,
Passo tudo por máquinas seletivas,
Depois agrupo em vocábulos e recolho no celeiro.
Então, é preciso debulhar, desfiar, tirar a casca
E espremer para obter o sumo,
Aquilo que há de mais essencial na palavra.
Semeio-as só por causa do seu néctar.
Assim nutro-me, cultivando palavras para fazer poesia.

Para semear uma boa lavra,
É preciso palavrear a semente
E preparar bem o campo.
Às vezes, ele sofre intempéries e pragas,
Que impedem seu florescimento.

Mas nada disso me faz desistir de
Ser empreendedora no campo das palavras e
Incentivadora da escrita e da leitura.
Estas, capazes de nos sustentar
E prover novas semeaduras
Para impedir que desfaleça
Nossa tão desnutrida cultura.
Palavralgia
Pausa para um cafezinho com Pessoa.

("Ser poeta não é uma ambição minha. É a minha maneira de estar sozinho." Estas são palavras do poeta, que gostaria fossem minhas.)

Os contos constantes do livro Além do Muro da Estrada foram inspirados no seu poema Eros e Psiquê. Esse foi o tema da conversa durante o café.

Sim, como gostaria de ter realmente tido esta conversa e contado a ele quais foram as minhas motivações ao escrever cada conto e desenvolver cada tema! Fico imaginando quais seriam as suas impressões e respostas.

Um hiato de 30 anos existe entre a sua morte e o meu nascimento. Este fato instiga, ainda mais, a curiosidade de como poderia se dar este diálogo por meio da mesma língua Portuguesa que, no entanto, apresentaria as diferenças regionais, temporais e, é claro, intelectuais. As antenas de Pessoa atravessam todos os tempos. Sou muito fã. É um dos meus ídolos.

A cantora Maria Bethânia, de quem sou muito fã também, sempre diz que Pessoa é o poeta de sua vida. Faço coro com a cantora e divulgadora da obra deste incomparável poeta.

Eu, que no primeiro livro Palavralgia, escrevi sobre "dor', deixo, abaixo, para reflexão, o poema AUTOPSICOGRAFIA, de Pessoa, sobre o mesmo tema.

O poeta é um fingidor
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que leem o que escreve.
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Poesias. Fernando Pessoa. 1ª publ. in Presença , nº 36. Coimbra: Nov. 1932.

Leio e releio este poema, mas confesso que ainda tenho dificuldade de alcançar seu sentido mais profundo. Este fato me remete a uma frase da Clarice Lispector em que ela diz que "é preciso saber não entender." Eu estou tentando aprender.
Palavralgia
As minhas experiências no plano das ideias são sempre muito mais reais e plausíveis. Por isso, o mundo da concretude me parece tão áspero, grosseiro, desconfortável, incômodo, irreal.

Qual será o plano das ideias? Remover da estante o retrato de um instante, transmutar o mundo, subverter a ordem, planejar nova ordem, desordenar tudo de vez, transgredir a ordem?

Certamente, o plano das ideias é sair definitivamente da planície para alcançar planos outros em que não exista tanta tolice. Seja o que for, quero fazer parte deste plano para não ficar em segundo plano engrossando as fileiras da mesmice.


Palavralgia
Dia desses, me peguei falando a seguinte frase para um jovem: “vocês são o futuro deste país.”. Engraçado! Eu mesma, há muitos anos, ouvi esta frase de um queridíssimo professor. Quantos de nós não ouvimos esta afirmação na escola? O interessante é pararmos para refletir sobre o que nos tornamos neste futuro previsto na assertiva; olharmos para nós mesmos e observarmos de que maneira nos transformamos no futuro ou, melhor ainda, como contribuímos para transformar o futuro que, hoje, é o nosso presente.
Quando examinamos a nossa linha do tempo, verificamos que o futuro é o resultado de todas as experiências que vivenciamos e ações que empreendemos no mundo, do qual não estamos apartados. Nenhuma novidade nisso. A questão é que precisamos ter esta consciência desde cedo. Mas este trabalho de despertamento desde a infância só pode ser realizado através da educação. E não somente a escolar, mas, sobretudo, a educação familiar, com ênfase na formação do caráter do indivíduo. É um trabalho conjunto. Não dá para fechar os olhos e delegar tudo à escola. Se atentarmos para a situação da educação, de maneira geral, no nosso país, é possível vislumbrar o futuro em que se transformará esta geração.
Em primeiro lugar, eu perguntaria quais são as prioridades da família brasileira. Só que antes disso, em incontáveis casos, é preciso perguntar onde está a família. 
Hoje, os adultos que constituem a sociedade em suas diversas áreas são o futuro do pretérito. Um passado já distante e bem diferente. A questão de como será o futuro do presente é muito mais profunda e complexa. Contudo, propicia uma reflexão sobre as perfeições, imperfeições, mais que perfeições e, eu adicionaria, mais que imperfeições de cada tempo. 
Este mesmo jovem, com quem conversava sobre o futuro do Brasil, quando questionado, me disse que seu professor de redação tem preferido conversar sobre temas ligados às áreas do conhecimento porque o nível cultural da turma está muito baixo e, consequentemente, a produção textual, medíocre.
Enquanto isso, livrarias encerram suas atividades país afora. Esta constatação é muito triste. Duas coisas que deveriam caminhar sempre juntas tomam direções completamente opostas. Jovens transitam, muitas vezes, por obscuras estradas da tecnologia e do desinteresse, talvez pela falta de orientação e incentivo. É aí que entra o papel primordial e imprescindível dos responsáveis. Em contrapartida, livros deixam de ser lidos e a mediocridade só avança.
Um país sem leitores não produz ideias, conhecimento, progresso e desenvolvimento. Antes, ocupa-se com questões menores, que vemos aos milhares todos os dias, e que não levam a nada.
O sambista, certa feita, registrou magistralmente seu recado em brilhantes versos musicais: “Não deixe o samba morrer, não deixe o samba acabar, o morro foi feito de samba, de samba, pra gente sambar.” 

O nosso pedido de hoje deveria ser: 

“Não deixe o livro morrer, 
não deixe o livro acabar, 
o povo precisa de livros,
de livros para se educar.”.

Sem produção e circulação de ideias, não existe crescimento.

Palavralgia


















Tenho escrito muitas coisas ultimamente, mas sou perfeccionista. Isto faz com que aproveite apenas em torno de 20% do que é produzido. E assim é a minha rotina de escritora, encher cadernos e mais cadernos com reflexões, pensamentos e sentimentos. Depois aguardar que decantem, fermentem para só então peneirar, refinar a fim de, quem sabe, um dia publicar.  O objetivo é encantar, em primeiro lugar, a mim mesma, livrando-me das minhas "algias". 📖 📚
Palavralgia
CANAL TODA POESIA
O texto Esquina narra o encontro de 3 personagens diferentes que se esbarram num mesmo ponto, numa mesma esquina.  Estes personagens somos nós mesmos transformados através do tempo, ou seja, quem fomos ontem, o que somos hoje e no que, talvez, nos transformemos amanhã. Ao longo da narrativa, é possível observar como o eu do passado, o eu do presente e o eu do futuro interagem no mesmo espaço através do tempo. 

Eu adoro este texto! Para quem ainda não conhece, vale a pena conferir. É só acessar o link para o CANAL TODA POESIA, abaixo da imagem.

Esta crônica consta do livro Palavralgia. 

Palavralgia
A criança que fui chora na estrada.
Deixei-a ali quando vim ser quem sou;
Mas hoje, vendo que o que sou é nada,
Quero ir buscar quem fui onde ficou.

Ah, como hei-de encontrá-lo? Quem errou
A vinda tem a regressão errada.
Já não sei de onde vim nem onde estou.
De o não saber, minha alma está parada.

Se ao menos atingir neste lugar
Um alto monte, de onde possa enfim
O que esqueci, olhando-o, relembrar,

Na ausência, ao menos, saberei de mim,
E, ao ver-me tal qual fui ao longe, achar
Em mim um pouco de quando era assim.
Fernando Pessoa

(Pessoa é sempre muito tocante, muito emocionante e profundamente inspirador. Deparei-me com este texto hoje e não resisti a compartilhar)
Palavralgia
Muita gente estranha quando ouve que a leitura pode ser um elemento modificador da vida. Há pessoas que questionam: “Poxa, a literatura é importante na minha vida, como assim?” Sim, a literatura é muito importante na vida das pessoas, podendo modificá-la de forma definitiva.

Um dos principais aspectos, de especial relevância, da influência da literatura na vida do indivíduo é o seguinte: quando não cultiva o hábito da leitura, o sujeito fica restrito ao vocabulário, às ideias, aos diálogos do seu círculo de convivência, o que é muito limitador. Já quando desenvolve o costume de ler, novos horizontes de “eus” possíveis se descortinam para o leitor, aumentando seu vocabulário e repertório. Esses conteúdos vão se agregando à sua estrutura psíquica, podendo ser acessados em qualquer circunstância da vida, porque abre o mundo para novas possibilidades, para o que é desconhecido. Através da leitura, é possível se transportar e explorar lugares e situações em que não se poderia estar pessoalmente.

Muitas vezes, um filme, um quadro, um livro é tão impactante, que marca a vida da pessoa para sempre, fazendo com que ela se identifique e considere que aquilo lhe interessa, que aquilo ela quer ser ou fazer, que aquilo ela pode colocar no seu repertório porque é nutritivo e enriquecedor. Novos contextos fazem com que seja possível estabelecer uma rede de correlação de conteúdos que podem atribuir novos significados à existência e ao mundo.

No livro do Márcio Borges, Os Sonhos não Envelhecem: histórias do Clube da Esquina, o autor conta que o cantor Milton Nascimento ficou tão impactado com o filme Jules e Jim (filme francês de 1962), que o assistiu várias vezes. E o próprio cantor relata que este filme modificou totalmente a sua forma de pensar.

Então, esta é a importância da literatura na nossa vida, além de contribuir fortemente para diminuição da mediocridade em que, frequentemente, nos vemos inseridos.

Palavralgia
Estou divulgando o texto abaixo, da Maria Luiza Poleti Martucci, porque achei muito procedente no momento atual. Creio que cada um de nós pode ajudar a reverter este quadro desolador da educação no país contribuindo para formação de leitores.

“Há um tempo, Pedro Bial nos pediu que usássemos protetor solar. Hoje, eu - que estou longe de ser Bial -, peço: comprem livros. Não importa o que aconteça. Se você se considera leitor ou não, se gosta ou não gosta de ler, compre livros.
Compre livros para dar de presente.
Compre livros para ler.
Compre livros pela capa.
Compre livros pelo título.
Compre livros para decorar a estante.
Compre livros pelo autor.
Compre livros de ficção.
Compre livros de não ficção.
Compre livros de literatura brasileira.
Compre livros de autoajuda.
Compre livros de negócio.
Compre livros no Natal.
Compre livros.
Compre livros porque sim.
Compre livros porque o Brasil é um país de não-leitores.
Compre livros porque ler ficção faz bem e promove empatia.
Compre livros porque autoajuda conforta e custa pouco.
Compre livros porque poesia acalma e ensina novos usos para palavras de todo dia.
Compre livros porque são livros.
Compre livros porque são baratos.
Compre livros porque 20 lojas da Saraiva fecharam.
Compre livros porque a livraria Cultura entrou com pedido de recuperação judicial.
Compre livros porque a Fnac encerrou as atividades no Brasil.
Compre livros.
Compre livros e salve os livreiros.
Compre livros e salve os editores.
Compre livros e salve os autores.
As livrarias estão a perigo no Brasil. As editoras também. Os livreiros também. Os autores também.
Comprar um livro pode ajudar. E muito.
Compre livros e, se não for pedir muito, dê preferência às livrarias físicas."

Maria Luiza Poleti Martucci
Palavralgia
Resolvi conceder um habeas corpus ao meu livro que encontrava-se, há muito, aprisionado na gaveta. Se escrevo com frequência, gosto de fazer isso e se todo trabalho deve ter uma finalidade útil, por que aprisioná-lo no armário? São estas as motivações que me levaram a querer publicá-lo, divulgá-lo. 

As minhas questões podem ser as questões de outros, ou não, o que é melhor ainda, porque pode levar a um olhar diferente. Acredito que assim seja com toda obra. Acho que todo texto acrescenta alguma coisa, deixa, de alguma maneira, uma ideia, um pensamento, uma impressão. Além disso, a arte tem que circular, tem que fluir. Assim, muito além da superfície lisa do entretenimento, esta obra procura mergulhar no íntimo tortuoso das dores e prazeres do ser.

Além do muro da estrada é constituído de cinco contos inspirados no célebre poema, Eros e Psique, do magnífico poeta português, Fernando Pessoa. Os textos procuram decifrar a incessante busca do “eu” em sua trajetória no mundo. O intuito é fazer, através da ficção, um estudo sobre a realidade para obter como resultado possíveis descobertas.

Cada conto tem duas histórias: uma linear que pode ser compreendida facilmente através do fio narrativo e outra que está contada por meio das metáforas apresentadas ao longo da escrita. É preciso mergulhar para acessar os dois universos, conjugá-los e fazer melhor proveito do texto.

Creio que, por tratar da alma humana em sua “viagem” pelo mundo, há muita identificação e reconhecimento na obra. Penso que isto torne a leitura atrativa. Contudo, acredito que o grande diferencial esteja no entrelaçamento das duas narrativas propostas: a plana e rasa que plaina na superfície e a que se desenha e aprofunda nas entrelinhas e que é a principal. O resultado do cruzamento das duas leituras propõe entretenimento e reflexão.

Este é o primeiro livro de contos da minha lavra e está disponível, por enquanto, somente em formato digital pela Amazon.com.